O psicólogo João Carvalhaes fora contratado justamente para transformar o nostálgico, emotivo e temperamental jogador brasileiro num atleta psicologicamente preparado para suportar as pressões a que estava sujeito numa Copa do Mundo. Desde o início, seus conhecimentos de psicologia entraram em conflito com as complicadas sutilezas do esporte. Não foi à toa que, após se submeter ao psicoteste, a portas fechadas com Carvalhaes, Nílton Santos chamou o psicólogo a um canto e fez um apelo em forma de advertência. "Olha, doutor, está aí fora um sujeito que talvez não seja capaz de acertar o mais fácil desses testes. É o Garrincha. Por favor, doutor, tenha paciência com ele. Mesmo que erre tudo, aprove-o. Aprove-o, doutor, pois nós vamos precisar muito dele nesta Copa", suplicou o quarto-zagueiro. Carvalhaes, felizmente, ouviu o apelo de Nílton Santos. Foi, talvez, sua maior contribuição à Seleção Brasileira.
Às 5 horas da tarde de 24 de maio de 1958, a Seleção Brasileira embarcou para a Europa. Os preparativos para a Copa do Mundo duraram pouco mais de um mês. Agora, antes da estréia na Suécia, haveria mais dois amistosos na Itália, o primeiro com a Fiorentina e o segundo contra a Internazionale de Milão. Mas os dois jogos - ambos vencidos pelo Brasil por 4 x 0 - não serviram para definir muita coisa. Pelo contrário, deixaram o gordo Feola ainda mais longe do time ideal.
Sem Garrincha e sem vários outros jogadores que tinham condições de sobra para serem os titulares, a Seleção Brasileira estreou na Copa do Mundo em 8 de junho, em Uddevalla, diante da Áustria. A estréia não apresentou maiores problemas para os brasileiros, cuja equipe, mesmo sem ser a ideal, estava muito acima da modesta e pouco imaginativa Seleção Austríaca. Resultado: 3 x 0, com dois gols de Mazola e um de Nílton Santos.
O segundo jogo contra a Inglaterra, em 11 de junho, em Gotemburgo, deixou ainda mais nítidas as deficiências da Seleção Brasileira. Foi um suadíssimo 0 x 0, os brasileiros jogando melhor, os ingleses resistindo bem na defesa e tentando os contragolpes. Foi este jogo - ou as deficiências nele ressaltadas - que levou Bellini, capitão do time, mais Nílton Santos e Didi a baterem um longo papo com Vicente Feola, nos jardins de Hindas, dois dias antes da partida em que brasileiros e soviéticos definiriam a sorte do seu grupo.
Didi, por exemplo, achava que o meio-campo precisava de um jogador menos clássico e mais vibrante que Dino Sani. Um jogador assim como Zito. Já Bellini lembrava o comportamento de Mazola durante o jogo com os ingleses: ao perder um gol feito, o atacante sofrera uma crise nervosa, em pleno campo, chorando, gritando, esperneando, pedindo que o levassem para longe dali. Bellini fora obrigado a dar-lhe uma bofetada, fazendo-o voltar a si. Bellini, Didi e Nílton Santos concordavam: já era tempo de dar uma chance a Pelé. O garoto tinha apenas 17 anos, é verdade. mas sangue novo também ajudava. Por último, o argumento do próprio Nílton Santos sobre Garrincha: - Joel é um bom jogador, aplicado, vivo, raçudo. Mas a gente precisa de um Garrincha para surpreender esses gringos. Sem Garrinha, acho muito difícil o nosso ataque furar certas defesas européias.
Feola ouviu, atento, as ponderações dos três - Bellini, Didi e Nílton Santos, jogadores pelos quais o treinador tinha grande respeito. Foi então que decidiu escalar Zito, Pelé e Garrincha naquele jogo com os soviéticos.
Minutos arrasadores
Em 15 de junho, o Estádio Nya Ullevi, em Gotemburgo, recebia mais de 50 mil pessoas, na maior assistência que seria registrada em todo o campeonato. E o Brasil, com o "irresponsável" Garrincha, o inexperiente Pelé e o desconhecido Zito, entrava em campo para uma grande vitória. Os dois primeiros minutos daquela partida constituem um dos mais belos momentos da história do futebol brasileiro. Os dribles seguidos de Garrincha sobre Kuznetsov, os marcadores que se multiplicavam à frente daquele fenômeno de pernas tortas, novos dribles de Garrincha, um chute de Garrincha na trave, o passe perfeito de Didi, o gol de Vavá - tudo em apenas 2 minutos. Naqueles dois minutos, o Brasil partira não apenas para uma vitória de 2 x 0 sobre os soviéticos mas para a própria conquista da taça de ouro.
A Seleção, quase por acaso, definira-se naquele jogo, passando às quartas-de-final como primeira colocada do Grupo 4, em que a União Soviética, apesar da derrota, classificou-se em segundo.
As quartas-de-final foram disputadas em 19 de junho, a Alemanha Ocidental derrotando a Iugoslávia, a França passando pela Irlanda do Norte e a Suécia brilhando diante da União Soviética. Ao Brasil coube enfrentar o País de Gales, cuja seleção, trancada durante os 90 minutos de jogo, parecia ter entrado em campo com a preocupação única de não ser goleada. Um gol de Pelé, já no segundo tempo, fez o Brasil respirar aliviado: 1 x 0, vitória dificílima em Gotemburgo.
Nação de admiradores
As semifinais, em 24 de junho, dariam à Suécia uma dupla alegria: seu triunfo sobre a Alemanha Ocidental e a vitória do Brasil frente à França. O futebol brasileiro ganhara ali uma nação de admiradores. Por isso, os suecos haviam torcido contra os franceses, goleados por 5 x 2 em mais uma exibição brasileira. Pelé - "um menino de 17 anos, ainda sem idade para assistir aos filmes de Brigitte Bardot" - fez três gols contra os franceses, Vavá um, Didi outro. O Brasil estava na final.
Choveu muito no dia da final e o campo ficou encharcado, como os suecos queriam. O Brasil teve de trocar a camisa amarela pela azul, também como os suecos queriam. E o primeiro gol, logo no início, foi feito pelo veterano Liedholm, ainda como os donos da casa desejavam. Além disso, o time de Feola tinha não o titular De Sordi, mas o reserva Djalma Santos para marcar Nacka Skoglund, a grande estrela do ataque sueco. Mas a Copa do Mundo de 1958 - desta feita para premiar o melhor - voltava a contrariar as previsões dos experts, numa final em que o Brasil goleou a Suécia por 5 x 2.
Com uma atuação perfeita - técnica, física e psicologicamente acima de tudo o que os profetas do futebol tinham antecipado -, os brasileiros tornaram-se campeões mundiais pela primeira vez. E não era para menos. A Copa do Mundo realmente estava em boas mãos.
Brasil 1958 : Gilmar, Castilho, De Sordi, Belini, Orlando, Zózimo, Nilton Santos, Djalma Santos, Zito Dino Sani, Moacir, Didi, Joel, Garrincha, Dida, Pelé, Mazola, Zagalo e Pepe.
Brasil 1962 - Seleção do Bi
A seleção brasileira tinha como base o mesmo time que havia conquistado o mundial na Suécia. Mauro, reserva de Belini em 1958, seria o titular e capitão do time. Zózimo, também reserva em 1958, ocuparia o lugar de Orlando, que havia se transferido para o Boca Juniors da Argentina. Embora a preparação física e técnica dos canarinhos iria seguir o mesmo plano de trabalho imposto em 1958 por Paulo Machado de Carvalho, Aimoré Moreira assumiria o lugar de Vicente Feola no comando tácnico. Também estaria no Chile uma personagem bastante conhecida ainda hoje pelo torcedor do Brasil: o massagista Mário Américo.
A fase preparatória que antecedeu a ida ao Chile teve seis jogos da Seleção Brasileira em gramados cariocas (Maracanã) e paulistas (Pacaembu), todos com vitória do escrete nacional: 6 x 0 e 4 x 0 contra o Paraguai, 2 x 1 e 1 x 0 contra Portugal, 3 x 1 e 3 x 1 contra o País de Gales. Embora o time estivesse praticamente definido, havia ainda certa incerteza entre Vavá e Coutinho como centro-avantes, Mauro e Belini na zaga, e Pepe e Zagalo na ponta esquerda. Finalmente, Aimoré Moreira decide por Vavá e Zagalo, além de substituir Belini por Mauro, o qual ainda ganhou o posto de capitão da equipe. Para outras posições, Gilmar era o dono absoluto do gol, Didi e Zito, embora ameaçados por Mengálvio e Zequinha, foram os titulares de Aimoré até o final da competição. Pelé e Garrincha eram os donos absolutos das suas posições, embora tivessem em Amarildo e Jair da Costa dois excelentes reservas.
Brasil 3 x Tchecoslováquia 1
Para muitos, este é considerado o jogo mais bonito de todo o campeonato, onde ambas as equipes exibiram alto padrão técnico e futebol veloz. Os tchecos iniciam dominando a partida e jogando melhor os primeiros quinze minutos, quando um chute forte e rasteiro vence o goleiro Gilmar e abre o placar em favor da Tchecoslováquia. O placar desfavorável motiva a reação brasileira e, passados 3 minutos do gol tcheco, Amarildo é lançado na esquerda, passa dois adversários e com muita classe e raça, chutando sem ángulo para empatar a partida. O primeiro tempo termina com o placar de 1 x 1, com Garrincha, que até então vinha sendo o melhor jogador da copa, apático devido, provavelmente, a uma forte gripe contraída antes da partida.
No segundo tempo, Amarildo, que se destacava na partida, esta mais genial. Aos quinze minutos, passa por um zagueiro adversário com um drible seco e centra na direção de Zito, que penetra na área tcheca e cabeceia para dentro do gol. O jogo então prossegue com Didi e Zito comandando as jogadas pela esquerda em busca de Amarildo, o qual, com Zagalo jogando recuado, tem bastante liberdade de movimentação tanto pela ponta como pelo meio. Aos trinta e dois minutos, Djalma Santos já na altura da intermediária tcheca, chuta uma bola para o alto em direção a àrea adversária. Vavá aproveita a rebatida do goleiro tcheco, o qual estava muito adiantado, e manda um balão para o fundo das redes. O Brasil sela definitivamente a vitória e a conquista do bicampeonato mundial de futebol, estabelecendo mais uma vez a hegemonia do futebol nacional.
Brasil 1962 : Djalma Santos. Zito. Gilmar. Zozimo. Nilton Santos e Mauro.
Garrincha. Didi. Vavá. Amaraildo e Zagalo.
sábado, 27 de novembro de 2010
Brasil 1958 - Garrincha no psicotécnico
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Gazeta Esportiva,
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